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Beco da Poeira amarga perda de clientes para as feiras

By 03/05/2011maio 20th, 2011No Comments
Prejuízos e desilusão: permissionários reclamam da falta de investimentos, o que afastaria a clientela. Ontem, era possível caminhar com facilidade entre os manequins FOTOS: GEORGIA SANTIAGO

Prejuízos e desilusão: permissionários reclamam da falta de investimentos, o que afastaria a clientela. Ontem, era possível caminhar com facilidade entre os manequins FOTOS: GEORGIA SANTIAGO

Publicado em 3 de maio de 2011 Diário – CIDADE

Nascido de forma marginal em um terreno de terra batida, com 53 barracas, ganhou boxes e famas nos anos 1980

O Beco da Poeira está completando 20 anos de funcionamento. Há um ano mudou de lugar- e agora amarga uma série prejuízos que se mostram, principalmente, com a concorrência das feiras, galpões e vendas informais em ruas do Centro. Antes funcionando nas imediações da Praça José de Alencar, hoje está na antiga fábrica Thomaz Pompeu, na Avenida Imperador.

Os permissionários se queixam da necessidade de maior publicidade, da concorrência dita “desleal”, da distância da clientela e do que parecia improvável: o esquecimento.

Abandono
Ontem, por exemplo, segunda-feira e início de mês, era possível caminhar com facilidade entre os manequins apoiados em cadeiras e cabides abarrotados de roupas. Na verdade, bem mais mercadoria que cliente. Dois anos atrás, em um dia como ontem, andava-se no local, ainda na Rua 24 de Maio, com dificuldade, desviando dos mais apressados, tomando extremo cuidado com bolsas e relógios, tamanho o movimento.

No dia 10 abril fez um ano a transferência do antigo Beco para o atual. Antes disso os permissionários já temiam pela localização, mas não tiveram escolha. Estruturalmente, era o melhor local para o grupo. Hoje lá existem 2.097 boxes (no outro eram 2.030), além de 20 lanchonetes, quatro banheiros, 81 ventiladores e 15 entradas.

Os números chamam à atenção, mas não dão conta da satisfação de vendedores e permissionários. Muitos dos boxes têm ventiladores particulares, porque os do prédio não são suficientes. Além disso, mesmo com todos os acessos, as reclamações se concentram em torno da falta de propaganda. Para os trabalhadores, faltam indicadores de localização, placas e sobram goteiras em dias de chuva e insegurança nos dias de maior movimento. Apesar das queixas, o local ainda recebe compradores do Maranhão, Piauí, interior do Ceará e Pará.

Lucilene Ferreira, 40 anos, enfrenta quase dois dias de viagem para comprar confecção. Vai às feiras, ao Buraco da Gia, à Praça da Estação. É um entra e sai de ônibus com sacolas cheias de roupas femininas, de criança, algumas peças masculinas. Tudo com um destino: Belém do Pará. É assim a cada dois meses, pelo menos. Sobre o Beco, Lucilene tem sua opinião. Conhecia o antigo e não deixa de ir ao novo. “Tenho clientes que gostam de peça mais simples, essas que a gente compra na rua mesmo, nas feiras, e outras que preferem algo melhor, mais arrumadinho. Aí é do beco”, diferencia.

Para a vendedora Cida Mendonça, oito anos de Beco da Poeira, as vendas caíram pela metade com a mudança de local. “Se antes fazia R$ 1 mil num dia, agora às vezes a gente não chega a R$ 500”, reclama, acrescentando que há colegas que saem “colados” no fim do dia. Ela atribui a dificuldade a diversos fatores: ruas Liberato Barroso e Guilherme Rocha interditadas, falta de estrutura para segurança (rádio interna, telefone público, mais seguranças e banheiros) dos trabalhadores e clientes. Cida conta que, na última sexta-feira, houve um roubo. “Levaram o celular da dona do boxe e R$ 1,1 mil. Antes da Semana Santa um dia que houve três roubos”, queixa-se.

Promessas
Diante da insatisfação principalmente dos permissionários, a administração do Centro Municipal de Pequenos Negócios Beco da Poeira promete uma série de melhorias e a manutenção, pelo menos até o fim do ano, da atual taxa mensal de R$ 104. Chegou a existir um aumento para R$ 150, mas a Prefeitura voltou atrás diante do apelo dos pagadores. O que o local deve receber mais rápido é sistema de som, circuito interno de TV, mais banheiros e abertura de mais acessos.

De acordo com o administrador do Beco, Ivan Maranhão, há pelo menos 1.000 pessoas trabalhando no local e, por dia, passam pelo espaço cerca de 2 mil clientes. Segunda e quinta-feira são os dias mais movimentados, devido à demanda dos compradores de outros estados.

Sobre as goteiras, Maranhão informa que diariamente são feitos reparos. Ainda a respeito da estrutura e conforto, o administrador diz que o local não ficará só com os 81 ventiladores, mas terá 245. O que mais recentemente aconteceu foi uma licitação, em abril, para abertura de duas portas pela Rua Liberato Barroso. As outras ficam também na Princesa Isabel e na Avenida do Imperador. O funcionamento é de 7 às 17h30.

Um dos problemas é que há espaços com muitos boxes fechados, especialmente perto do cruzamento da Liberato Barroso com Imperador, justamente onde ficava a venda de CDs e DVDs piratas, interrompida em julho do ano passado.

LIVRO
Histórias de fortunas construídas entre boxes
O Beco da Poeira, independente do seu local de instalação, faz parte da cidade, do imaginário dos fortalezenses e abriga uma série de histórias não apenas de queixas, mas de fortuna construída entre aqueles boxes.

Apesar da popularidade do equipamento, essas informações ainda não haviam sido compiladas, até a jornalista Mayara de Araújo reunir, além de dados e contos, ilustrações sobre o espaço no livro Histórias de Beco, lançado neste mês no Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará (UFC) e, claro, no próprio beco.

A obra, fruto do trabalho de conclusão de Curso da Jornalista, ganhou o Prêmio Literário de Autores Cearenses e o de Melhor Produção Acadêmica de Livro-Reportagem do Brasil em 2010. Para chegar ao resultado, Mayara, que é repórter do Caderno 3 do Diário do Nordeste, passou dois meses pesquisando em hemeroteca e outros quatro no próprio espaço.

Foram cerca de 120 horas de pesquisa, sendo que a jornalista apenas entrevistou permissionários, vendedores e personagens típicos do equipamento no último mês de pesquisa. Nos três meses anteriores, foi ao local, andou, observou, sentou e percebeu como funcionava a dinâmica do espaço e de quem circulava pelo antigo beco.

MARTA BRUNO
REPÓRTER

Fonte: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=974360

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