Leiam com atenção o artigo abaixo, de autoria do embaixador do Brasil na Itália, José Viegas Filho, que a crise mundial. O artigo – intitulado A solução não será dada pelo mercado – está na edição desta quinta-feira, 6, na Folha de S. Paulo:
Nada indica que haja uma saída para a crise europeia -e mesmo mundial- que não envolva uma recessão prolongada, possivelmente associada a fortes flutuações e violentos impactos financeiros.
Recordemos que toda essa situação foi produzida pela euforia das grandes corporações financeiras, que durou até 2008 e nos levou à crise, sem a “ajuda” de ninguém -nem comunistas, nem terroristas, nem anarquistas, nem operários rebeldes- e na vigência da mais ampla desregulação e livre-iniciativa.
Embora seja impossível isolar inteiramente as duas coisas, é útil considerar a situação separadamente, do ponto de vista dos governos e do ponto de vista da elite financeira. Governos à parte, a atuação do mercado, no manejo das dívidas dos países mais fragilizados, tem sido tumultuada e tumultuosa.
Os números são erráticos, as reações são imediatistas, não refletidas e apresentam uma tendência a dramatizar dificuldades, criando grandes oscilações que produzem sensíveis perdas e ganhos financeiros. Ganha quem joga pesado.
A ação do mercado reage apenas às questões imediatas e se implementa por meio de programas de computadores para os quais a noção de longo prazo sequer existe e cuja sensibilidade política e social é, por definição, igual a zero. Essa ação tem como objetivo inegável ganhar dinheiro a curto prazo. Na hora de tomar decisões estratégicas, os governos não encontram nenhum apoio na parafernália tecnológica do mercado financeiro.
No entanto, essa força não encontra quem a contenha, e sua importância para a gestão das coisas públicas e privadas é onipresente e permanece inquestionada. A ação do mercado continua a ser a referência principal a guiar as ações dos governos.
Mas o que se vê é que a ansiedade e a pressão especulativa que têm caracterizado as finanças internacionais estão longe de ser a melhor bússola para as decisões dos governos. A atuação estreita e reativa do mercado é antes fator de perturbação do que de sensatez.
Os governos do hemisfério Norte se endividaram para evitar o colapso do mercado financeiro em 2008, usando trilhões de dólares do dinheiro dos contribuintes para corrigir os erros da própria elite financeira. Em decorrência disso, as economias nortistas entraram em estagnação. Os governos, agora, têm que cortar gastos sociais, deixando suas populações carentes de serviços básicos e sob a constante ameaça do desemprego. E o mercado exige dos políticos a austeridade que ele próprio não mostrou ter.
Assim é que os governos dos países do Norte, já carentes dos instrumentos de ação que foram dissolvidos pela onda antirregulatória, tampouco são capazes de impor um rumo sólido à economia. Seguindo, com unanimidade, a mesma lógica liberal que levou à situação em que se encontram, continuam tentando aplicar uma solução de mercado a uma situação para a qual este não oferece contribuição.
Saudades de Nelson Rodrigues, que nos ajudou a superar o “complexo de vira-lata” e nos deu sábios conselhos sobre a “unanimidade”.