CRIMINALIDADE
Equipamentos de última geração vão do rastreamento de veículos até o controle de acesso pela íris
Os extremos norteiam comportamentos dos fortalezenses na medida em que aumenta a violência na Capital. Eles acabam investindo e se tornando dependentes de sistemas de segurança, chegando ao ponto de ter de colocar uma senha para subir no elevador do próprio prédio. Hoje, as pessoas optam por se manterem “seguras” em suas casas cercadas por grades, muros altos, vigiadas por câmeras 24 horas por dia. Enclausuradas, elas vivem o medo e por isso investem em sistemas avançados de segurança.
Na opinião do coordenador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV), César Barreira, o problema é que os cidadãos não têm confiança nos órgãos de segurança pública e, portanto, não denunciam, pois não acreditam na resolução dos casos pela polícia.
“A gente vive uma cultura individualista em que a preocupação está em aumentar os muros, colocar grades e assegurar a tranquilidade pessoal e da família”, comenta. O coordenador ressalta que essa prática de colocar muros altos nas casas acaba aumentado ainda mais a possibilidade da realização de roubos e furtos. Ele explica que uma residência vazada (com grades), com abertura para a rua, inibe esses delitos.
“As ocorrências aumentam nos fins de semana justamente porque é quando as ruas estão mais vazias. A população precisa estar vigilante e ocupar os espaços urbanos como forma de coibir assaltos”, avisa.
Atualmente, é possível contar com equipamentos de segurança de última geração, como o controle de acesso por meio da íris, pela face ou pela digital, chamado de biometria; e até o rastreamento de veículos em que é possível localizar o motorista onde quer que ele esteja e até ver imagem em tempo real do automóvel.
O monitoramento pode ser feito com um rastreador pessoal, menor do que um celular. O aparelho liga, inclusive, para três números cadastrados, caso a pessoa esteja em risco, bastando acionar um botão. Outra opção é o sistema de alarme com comunicação via chip de celular. De acordo com o proprietário da Fort Rastreamento, empresa especializada em segurança, Pedro Adrião, o aumento dos índices de violência provocam uma procura maior por equipamentos, em cerca de 20% ao ano.
Além disso, como acrescenta o empresário, a melhora no poder aquisitivo das pessoas também faz com que elas invistam mais na segurança pessoal. “A criminalidade chegou a tal ponto que a polícia não dá mais conta, mas todo mundo quer segurança, então o jeito é investir em sistemas particulares”.
O gerente de segurança eletrônica da Corpus Fortaleza, George Câmara, afirma que a procura por sistemas de segurança aumenta no fim do ano, quando as pessoas viajam e precisam deixar a casa vazia, e no comércio, quando as vendas aumentam.
Em um prédio localizado na Aldeota, em Fortaleza, é preciso que o morador coloque uma senha para subir no elevador. Fora isso, seguranças estão por toda parte e um circuito interno de TV, com 32 câmeras, vigia quem entra e quem sai. A administração do condomínio informa que são os próprios moradores que solicitaram esse esquema.
Biométrico
A Academia Via Clinic, no bairro Dionísio Torres, adotou o controle de acesso biométrico por meio da digital. Os alunos são cadastrados e só têm acesso ao local dos aparelhos de ginástica com autorização do sistema. O instrutor de musculação da Via Clinic, Vitor de Castro França, revela que a intenção da academia foi organizar melhor o fluxo de entrada e saída, mas o controle de acesso acaba trazendo segurança. O advogado Leonardo Vieira, aluno da Via Clinic, sente-se mais seguro dessa forma. Ele acredita que esse tipo de tecnologia inibe ocorrências de assaltos.
Bairros nobres são alvo da violência
A criminalidade aumenta, a cada dia, em Fortaleza. E os bairros nobres são os alvos preferidos. A Aldeota, por exemplo, registrou, de janeiro a outubro deste ano, 232 delitos, sendo 120 roubos e 112 furtos. O Centro também é um dos mais inseguros. Foram 323 roubos e furtos em 2012. Os dados são da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Ceará (SSPDS).
O titular da Delegacia de Roubos e Furtos (DRF), Dionísio Amaral, reconhece que a demanda é bem maior do que o efetivo do órgão tem condições de atender. Segundo ele, os casos que mais acontecem são roubos de veículos usados para a realização de assaltos e que depois são abandonados.
Cabe à Polícia Militar atuar na prevenção à violência. O tenente-coronel Fernando Albano, assessor de comunicação da PM, revela que as ações são intensificadas nos bairros onde os índices de criminalidade são maiores.
De acordo com o coordenador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV), o roubo é definido como resultado da desigualdade social. “Para obter bens de consumo, pessoas acabam usando de métodos ilícitos”, destaca.
Outro problema apontado por César Barreira é que os delitos também são cometidos para pagar dívidas do tráfico de drogas. Ele lembra que os órgãos de segurança pública precisam estar nas ruas para coibir essas ações. “É necessário trabalhar também a impunidade”. Isso porque, segundo o especialista, os bandidos fazem o cálculo, cometendo assaltos apenas se não tiverem de pagar. “Quanto menor o risco de ser preso, maior é o destemor de realizar o delito”, comenta.
LINA MOSCOSO
REPÓRTER
OPINIÃO DO ESPECIALISTA
Vivemos a arquitetura do medo
Nos últimos 20, 30 anos, temos visto uma arquitetura do medo no que concerne à forma como as habitações são construídas. O tipo de estrutura é baseada no temor, na tentativa de levar para as pessoas uma segurança que é subjetiva. Trata-se de uma arquitetura vinculada ao aumento da violência e à publicização das estatísticas. O medo subjetivo está vinculado aos dados e a outras questões, como o temor do outro, as diferenças de classes e o sistema de preconceito de valores. Isso vem marcando o nosso tempo.
Nos últimos 30 anos, a autossegregação espacial (moradia em condomínios fechados) e o autoenclausuramento em espaços fechados, como shoppings e parques privados, tem servido como forma de proteção àquilo que seria o medo. Com isso, o lazer e a cultura começam a passar pela “privatização”. As consequências são o esvaziamento dos espaços públicos, que já são anômicos (sem regras, apesar de elas existirem) e anêmicos (sem vida). E isso cria um ciclo vicioso que precisa ser rompido. As ruas vazias contribuem para a insegurança.
Mas a segurança funciona para além da questão espacial. Há de se levar em consideração o fator institucional. Nos últimos anos, ela tem se tornado o principal problema dos governos. Tem se configurado a militarização da questão urbana. Assim, os outros problemas acabam sendo encobertos. Há um divórcio entre o planejamento urbano e a segurança pública. No entanto, as formas das cidades são fundamentais para gerar a tranquilidade. É preciso reconfigurar planejamento e segurança de forma conjunta. Além disso, reconstruir a vida comunitária até onde for possível. Isso seria uma forma de atenuar o medo e a insegurança na vida urbana.
Élcio Batista
Sociólogo e pesquisador do LEV/UFC
Fonte: Diário do Nordeste