FEIRA DE TRANSTORNOS
Comerciantes, gestores públicos e até o pároco da Catedral reclamam de prejuízos com o desordenamento.
Após anos de transtornos, a feira no entorno da Rua José Avelino acontece, há duas semanas, sob forte esquema para impedir a ocupação de espaços irregulares e a restrição do tráfego de veículos. A ação tem revoltado os ambulantes que, ontem, fecharam algumas ruas do Centro em protesto. Contudo, quem vinha sofrendo com o desordenamento pede uma solução definitiva.
De acordo com a Secretaria Regional do Centro de Fortaleza (Sercefor), a força-tarefa que impede a ocupação irregular já acontecia há dois anos, mas foi ampliada nos últimos dias. “Essa ação é necessária, mas não estava mais conseguindo coibir as irregularidades com a estrutura anterior”, explicou o titular da Pasta, Ricardo Sales. Segundo ele, o formato atual irá continuar até o Carnaval. “Depois disso, ele será reestruturado, mas manterá o necessário para manter a desocupação”, garantiu.
O apelo para a continuidade das operações vem de diversos setores. Lojistas, gestores públicos e até o pároco da Catedral Metropolitana de Fortaleza se dizem prejudicados. “A gente sabe que aquilo é uma solução social que o governo encontrou. Mas existe um grande problema ligado à solução, que é gerar desemprego”, afirma o presidente do Sindicato do Comércio Varejista e Lojista de Fortaleza (Sindilojas), Cid Alves. “Pagamos impostos, geramos empregos e, a cada dia que a feira se instala, nossas rendas caem”, lamentou.
Alves sugere uma desoneração de impostos para o setor têxtil a fim de permitir a formalização dos feirantes. “Não vejo por que essa área não possa ser desonerada de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e reduzir a carga sobre toda a cadeia produtiva”, ressaltou. Ele acredita que o benefício permitirá que aos feirantes trabalhem durante o dia e saiam das ruas.
Enquanto as soluções não são efetivadas, muitos estabelecimentos do entorno têm o funcionamento afetado, incluindo equipamentos culturais, como o Centro Dragão do Mar. “Hoje, o nosso problema número um é a feira. É uma indisciplina absurda”, ressalta o presidente do Instituto, Paulo Linhares.
Conforme ele, a situação é mais complicada próximo à Praça Verde, no cruzamento da Rua José Avelino com Rua Bóris. “São ruas estreitas, mas os carros estacionam em fila dupla, e os ônibus circulam na contramão. Fecham a passagem e estão avançando sobre o Dragão do Mar. Os guardadores de carro ameaçam”. Para Linhares, isso prejudica a Praça Verde, o tráfego, os visitantes e cria um ambiente hostil e agressivo.
“A feira é ótima, mas por que precisa ser no Centro Histórico? Destruíram uma rua com o calçamento tombado”, lembra o gestor, referindo-se ao piso que se tornou Patrimônio Cultural Material da Capital em 2012. Linhares pede uma mobilização da sociedade para resolver o problema. “Ou há uma disciplina, ou a feira vai destruir o Dragão do Mar. Ela está associada a todo tipo de desordem urbana”, diz.
Nem mesmo a Catedral de Fortaleza escapa dos problemas. Padre Clairton Alexandrino, pároco da Sé, lamenta os danos causados pelo comércio irregular, como a destruição do jardim na parte externa. “Os plásticos que eles usam ficam no estacionamento e acabam entrando na Catedral. E sobem para teto, impedindo que a água da chuva desça, gerando uma infiltração muito grande”, afirmou.
O gradil que circunda a edificação também estava para cair devido às mercadorias penduradas. “Só não caiu porque fizemos um reparo de urgência”, disse. Contudo, para o pároco, o mais constrangedor são as roupas íntimas expostas durante as missas. “Eles não respeitam. Estão tomando até a frente do portão. Nem entrar para fazer um batizado dá. Eu mesmo já tive que entrar a pé”, finalizou.
Apesar dos transtornos, o maior problema é, para o secretário da Regional Centro, a mobilidade. “O Centro era paralisado no dia de feira e chegar lá virava um sacrifício. Isso traz prejuízo econômico”, disse Sales. Mesmo assim, ele reconhece as outras situações. “O padre Clairton já teve que cancelar missas. Os comércios da circunvizinhança ficavam prejudicados. O Mercado Central também, já que os ônibus de turismo voltavam do meio do caminho por não conseguirem chegar”, enumera.
Trânsito
Sobre o trânsito no local, o diretor de operações da AMC, Disraeli Brasil, explica que o tráfego lento se dá porque outros feirantes foram atraídos para o comércio popular e acabaram ocupando vias não permitidas, como a Av. Alberto Nepomuceno. “Há outros estacionamentos que têm causado grandes congestionamentos, especialmente para quem vem da Barra do Ceará, até porque eles descarregam mercadorias ali”, explica.
Brasil reforça que sempre houve uma pressão para que houvesse ordenamento. “Só que a AMC precisa de um apoio de segurança e, desta vez, não foi só a Guarda Municipal, mas a Polícia Militar”, afirmou.
A PM participou da operação com o Batalhão de Choque (BPChoque), o Esquadrão de Policia Montada e o Batalhão de Policiamento de Rondas de Ações Intensivas e Ostensivas (BP Raio). A ação também contou com o apoio dos Bombeiros, do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e do Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
Ambulantes protestam contra ação de ordenamento
Em protesto contra as ações de ordenamento, cerca de 300 feirantes ocuparam, na manhã de ontem, algumas ruas do Centro em passeata até o Paço Municipal. O grupo queria uma audiência com o prefeito Roberto Cláudio. O tráfego de veículos ficou bloqueado, causando grande congestionamento.
A manifestação partiu da Praça do Ferreira e seguiu para a Praça José de Alencar. De lá, os feirantes percorreram as ruas General Sampaio e Castro e Silva até a sede da Prefeitura. Em alguns momentos, houve tensão. A situação só se acalmou após o apelo dos organizadores. O Grupo de Operações Especiais da Guarda Municipal (GOE) esteve presente no local.
O presidente da União dos Feirantes no Ceará, Heron Moreira, reclama da falta de diálogo com a gestão municipal. “Não existiu, em nenhum momento, interesse da Prefeitura em negociar com a categoria dos feirantes”.
O movimento foi pacífico e se dispersou após uma promessa de audiência com o secretário da Regional do Centro. Segundo Ricardo Sales, foi agendada para hoje uma reunião com uma comissão dos feirantes.
Acordo
Em entrevista à TV DN, Roberto Cláudio informou que, desde o ano passado, foi firmado um acordo com os feirantes, no qual eles trabalhariam às quartas, sábados e domingos. Mas, devido aos festejos de fim de ano, o compromisso foi quebrado, atrapalhando o trânsito. “Novas fiscalizações estão sendo realizadas para cumprir o primeiro acordo firmado com os feirantes. Estamos abertos ao diálogo”, disse.
O acordo permite a ocupação da Rua José Avelino, da Travessa Icó, o primeiro quarteirão da Rua Governador Sampaio e o “feirão” sob o viaduto da Av. Leste-Oeste. O horário é das 19h de quarta-feira às 7h de quinta-feira, e das 19h de sábado até as 11h do domingo.
Fonte Jornal Diário do Nordeste.