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Centro de Fortaleza acumula problemas sem previsão de soluções – DN

By 09/02/2015No Comments

Apesar de ser uma área estratégica para a Capital, o bairro segue sendo degradado de forma acelerada

O comércio informal é um dos fatores mais evidentes da carência de ordenamento no Centro. Oficialmente, há 1.471 camelôs registrados na Prefeitura, mas as ruas e galerias abrigam o dobro deste número de ambulantes FOTO: JL ROSA
O comércio informal é um dos fatores mais evidentes da carência de ordenamento no Centro. Oficialmente, há 1.471 camelôs registrados na Prefeitura, mas as ruas e galerias abrigam o dobro deste número de ambulantes FOTO: JL ROSA

Os passos rápidos buscam o consumo e os demais elementos do Centro de Fortaleza e são, muitas vezes, ignorados. Por dia, cerca de 350 mil pessoas passam pelo bairro que é patrimônio histórico da cidade e padece com a ausência de preservação. Sujeira, odores, disputas entre os comércios e conflitos de uso do espaço público fazem o cotidiano da área que apesar de estratégica, acumula problemas e promessas de revitalização.

Na área que abriga 28.447 imóveis, entre residências e comércios, a deterioração do patrimônio é acelerada. Apesar da demarcação feita pela Prefeitura nas calçadas para tentar organizar os ambulantes, ainda é comum deparar-se com mercadorias distribuídas no chão ou em bancas de diferentes tamanhos. Um comércio informal que tem 1.471 camelôs registrados no Município, mas que na prática abriga o dobro deste número nas ruas e galerias.

Manutenção
Nas 33 praças do bairro, os estados de conservação são distintos. Mas, as queixas quanto à falta de manutenção predominam. A presença de moradores de rua é constante, sendo as praças do Ferreira (que em 2014 chegou a abrigar 180 pessoas), José de Alencar, do Sagrado Coração de Jesus e o Parque das Crianças as que têm o maior número de desabrigados.

A ocupação irregular predomina e mercadorias impedem o fluxo de pedestre FOTO: FERNANDA SIEBRA
A ocupação irregular predomina e mercadorias impedem o fluxo de pedestre FOTO: FERNANDA SIEBRA

“Aqui era até tranquilo, mas hoje tem muita gente morando. E a reforma que foi prometida, até agora ninguém viu”, queixa-se o engraxate Edimilson Bernardo, que há décadas atua na Praça José de Alencar.

Atualmente, o equipamento que tem vários barracos de moradores de rua está com o piso degradado e acumula pichações e mau cheiro. “Nem acredito mais nessa reforma. Para mim, se tivesse pelo menos manutenção já estava bom demais”, ressalta a dona de casa Sueli Guimarães Ferreira, moradora do Centro, que todos os dias leva a filha para brincar na praça.

No Parque das Crianças, a situação é menos precária, mas ainda assim, quem utiliza o espaço torce por melhorias. Na Praça da Lagoinha o comércio ambulante predomina e como entorno do equipamento é usado como “banheiro a céu aberto”, o odor é constante.

Para o presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL), Severino Ramalho Neto, a qualificação do Centro é demanda antiga, mas continua urgente. O representante dos lojistas garante que a regulamentação do comércio informal, a segurança, a higiene e a limpeza são os grandes gargalos que afetam o local.

E é justamente a garantia efetiva destes serviços que impactam na conservação do patrimônio, segundo o superintende do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Ceará, Murilo Cunha. De acordo com ele, “é impossível desconectar a preservação de outros fatores, como uso do bairro e apropriação dos espaços”, defende.

O arquiteto garante que a “pressão pela mudança e destruição do patrimônio e intensa e contínua”. Na maioria das vezes, segundo ele, os prédios históricos continuam sendo demolidos para darem lugar a galpões.

A insegurança é outra reclamação. A Secretaria Municipal de Segurança Cidadã garante que 28 guardas municipais fazem diariamente o ciclopatrulhamento do Centro, percorrendo as principais praças. A vigilância também é feita através de 24 câmeras instaladas.

Já o comandante da 1ª Companhia do 5º Batalhão, major Ribeiro, informou que o policiamento do bairro é feito por agentes distribuídos em diversas duplas nas esquinas de ruas que concentram o maior número de ocorrências. As praças do Ferreira, José de Alencar, da Estação e Coração de Jesus, segundo ele, contam com duplas de policiais durante 24 horas. O patrulhamento motorizado é feito por três viaturas.

Thatiany Nascimento
Repórter

Ações  não têm  prazo de execução
Para o poder público, segundo o secretário do Centro, Ricardo Pereira, o fator que mais preocupa no bairro é o desordenamento dos camelôs. Porém, a solução “definitiva” que é a construção de um novo centro de comércio popular para abrigar os ambulantes que, hoje, ocupam as vias do quadrilátero – Duque de Caxias, Castro e Silva, Conde D’eu e Imperador- é uma ideia ainda sem prazo para execução.

O mesmo ocorre com as ações de incentivo à moradia no Centro. Embora o poder público saiba que o bairro concentra cerca de 190 imóveis abandonados, não há nenhum projeto sendo elaborado sobre o assunto.

Em relação à regularização de todos os galpões de confecção que, segundo o secretário da Regional do Centro, Ricardo Sales, não possuem alvará, o processo poderá ocorrer quando a Lei de Uso e Ocupação do Solo do Município for alterada. A modificação é discutida pela Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente, mas não há prazos.

Ricardo informou também que para solucionar imediatamente alguns problemas estruturais no bairro, a Secretaria implantou um projeto piloto de ciclomonitoramento. Nele, dez auxiliares de fiscalização fazem abordagens educativas quanto ao descarte correto de lixo, além de registrar problemas referentes a fiação, buracos e calçadas.

Em relação à reforma da Praça José de Alencar, o secretário garante que o projeto que envolve também o Estado e a União já teve a licitação iniciada no âmbito estadual. Mas, não há especificação do início das obras.

O secretário assegura ainda que o Programa de Valorização e Ampliação da Infraestrutura e Atividade Turística de Fortaleza (Provatur) conduzido pela Secretaria de Turismo, que terá investimento na ordem de 250 milhões de dólares, deverá recuperar dez prédios históricos, 13 praças, calçadas e garantirá a fiação subterrânea. Porém, nenhum prazo para o começo de tal ação foi informado.OPINIÃO DO ESPECIALISTA

Área une pessoas de bairros periféricos
O Centro tradicional em Fortaleza se caracteriza atualmente como Centro da Periferia, cotejando, dentre seus usuários, volume cada vez maior de pessoas provenientes dos bairros periféricos.

O fenômeno iniciado na segunda metade do século XX, quando a cidade de Fortaleza se torna policêntrica, até hoje é apreendido como evidência de esvaziamento de caráter demográfico, econômico e de representatividade do Centro em relação a outros espaços da cidade. Isto dá vazão a abordagens saudosistas, representativas da época em que o Centro era a cidade: lócus do poder, do comércio, de habitação das populações abastadas e do lazer.

Presos aos vestígios materiais (patrimônio arquitetônico histórico) deixados pelas gerações pretéritas reduzem suas críticas ao descaso do poder público em relação à área, passando a ideia de abandono.

Poucos lidam com sua caracterização contemporânea, representativa de uma diversidade e dinâmica apreendidos no redimensionamento das atividades ligadas ao comércio, aos serviços e à recreação que nele hoje se efetivam.

No Centro, o comércio popular adquire relevância, o informal inclusive, abunda número cada vez maior de clínicas populares, a rede de escolas públicas é significativa, os terminais de transporte público são os mais importantes da cidade, bem como a disponibilização de espaços de sociabilidade com as praças e suas rodas de conversa, os bares e restaurantes que chegam a incorporar, no horário de pique, as calçadas das ruas e as salas de cinema (pornôs principalmente).

Tudo a justificar fluxo incomensurável de pessoas que dá a cor e o tom característico do Centro. Não podemos pensá-lo olhando somente para o que se perdeu, em uma perspectiva arqueológica. Urge, agora, pensá-lo em diálogo com aqueles que o fazem no presente.

Eustógio Wanderley Correia
Geógrafo e professor universitário

asd

Fonte: Jornal Diário do Nordeste.