EDITORIAL
No devastador processo de expansão do uso do crack, droga de fácil aquisição e bastante rápida na criação de dependência em seus consumidores, parece ainda não haver sido encontrada uma maneira objetiva de se lidar com o problema, por mais frequentes que sejam os planos e táticas divulgados nesse sentido. Enquanto no Rio de Janeiro vigora a obrigatoriedade de tratamento para os usuários que perambulam pelas ruas da cidade, com base na internação compulsória prevista em lei, em São Paulo são executadas operações policiais, que aparentemente não objetivam dar assistência social em relação aos dependentes.
Segundo pesquisa realizada pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o Brasil é o maior consumidor da pedra de crack em todo o mundo. Anteriormente, a maioria dos pedintes de rua, nos quais estão incluídos menores de idade, solicitavam uns trocados para comprar comida ou, mesmo, para o consumo de bebida alcoólica, mas agora o fazem para alimentar o terrível vício da droga que se alastrou com maior rapidez e virulência em todos os tempos.
O consumo do crack é mais acintoso nas grandes metrópoles, porém já contaminou capitais menores e está presente em pequenos municípios interioranos. Nos centros de maior densidade demográfica proliferam as chamadas “cracolândias”, onde os viciados se reúnem para fazer uso da droga e, desse modo, criam nocivos guetos, nos quais vivem em condições precárias.
Em Fortaleza, os redutos do “crack” não se limitam à periferia, onde se concentram as classes sociais menos favorecidas. Já ganharam espaços urbanos considerados nobres e se multiplicam no perímetro central, tomando conta das principais praças desde o cair da noite, após o encerramento do expediente nos estabelecimentos comerciais. Os usuários se imiscuem entre os moradores de rua e de algumas pessoas carentes, mas o processo de cooptação logo ocorre, aumentando o círculo do vício.
As pedras letais começam a ser consumidas muito cedo, haja vista a elevação dos índices de crimes entre menores de idade, em sua maior parte originados por dívidas de drogas e praticados a mandado de traficantes, que operam ostensivamente em pontos estabelecidos, mostrados até mesmo em programas policiais de televisão. Até do interior de presídios são comandadas redes de “aviões”, como são conhecidos os distribuidores do nefasto produto.
A internação compulsória dos viciados assumiu caráter polêmico, até pela falta de apoio de uma rede estruturada para executar esse atendimento. Enquanto recrudescem os debates sobre reformas nas leis relacionadas ao uso de drogas, entre as quais o crack é considerada a mais nociva, ressalta-se a importância do novo conceito de “redução de danos”, no qual se procura preservar o viciado da severidade das penas.
Um dos fortes argumentos dos que aprovam o princípio da redução de danos, que procura tratar os usuários como caso de saúde pública, é o fracasso observado nas providências excessivamente repressivas ou violentas, as quais, por vezes, apenas estigmatizam e marginalizam indivíduos possivelmente recuperáveis por meio de assistência adequada.
Existe sentido na preocupação de se perseverar nas tentativas de ressocialização dos viciados. Mas também há que se atentar para meios que consigam controlar, na medida do possível, os tentáculos poderosos do narcotráfico, sempre a expandir-se à procura de incautas vítimas.
Fonte Diário do Nordeste