AMBULANTES IRREGULARES
Arquitetos, urbanistas, sociólogos, historiadores e gestores são unânimes: a solução para o Centro está no próprio Centro
A ocupação dos espaços públicos da cidade, como Centro e Beira-Mar, pelo comércio ambulante irregular, não é novidade. Com a desculpa do desemprego, da luta pela sobrevivência, da necessidade de trabalho, eles foram chegando, se avolumando, tomando as ruas, calçadas, praças e vendem de tudo, sem nota, sem garantia, produtos piratas, de qualidade duvidosa, confecção de fundo de quintal, comida sem crivo da vigilância sanitária.
Com a facilidade de simplesmente armar uma barraca, jogar um saco plástico no chão ou andar cheio das mercadorias, sob o olhar displicente de quem passa, com a conivência do consumidor que prefere comprar “mais barato” sem se importar com as conseqüências para a economia da própria cidade e o “empurra com a barriga” dos gestores municipais, eles foram “gostando”, encontrando facilidade e ficando.
Multiplicação
Agora, é impossível “fingir” que eles não existem. Ficou quase imsuportável andar pelo Centro, pela Beira-Mar. É preciso ser atleta para driblar as barreiras. Falta espaço para tantos, numa concorrência predatória. De acordo com a última pesquisa realizada pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE), em 2006, eles somavam dez mil. Hoje, passam dos 20 mil. Parece uma progressão geomátrica. “Um problemão a ser resolvido”, afirmam especialistas em urbanismo, arquitetura, patrimônio histórico, historiadores, economistas, gestores públicos e a própria população que confessa, apesar da quase cumplicidade na manutenção desse comércio, que não aguenta mais e quer a cidade de volta.
Num ponto, a maioria concorda: o Centro de Fortaleza é uma excrescência do ponto de vista urbanístico, de tráfego, de asseio e conservação, de conforto. Enfim, é o espaço da não-cidadania, quando deveria ser o espaço da cidadania por excelência. E é preciso fazer alguma coisa urgente.
Projetos para a recuperação do Centro histórico existem, seja no incentivo à habitação, a reforma do Paço Municipal, a Rua das Praças. Para tudo isso dar certo, avaliam os estudiosos, é necessário, antes de mais nada, transferir os ambulantes para locais determinados, com boa infra-estrutura e aumentar a fiscalização para evitar que novos camelôs sem cadastro ocupem os mesmo espaços.
Pesquisadores também são unânimes em afirmar que a solução para a ocupação desordenada do Centro está no próprio Centro. Um deles é o arquiteto, urbanista e coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Fortaleza (Unifor), Euler Muniz.
Para ele, é necessário que se entenda que a cidade é composta por seres humanos, bastante complexos em suas demandas pessoais e nas relações com os demais. “Não se pode pensar a cidade de modo pontual e com ações isoladas”, analisa. O planejamento funciona muito mais como uma grande teia em que o vibrar de um nó repercute em significativa parte da rede. O Centro, defende, tem de ser pensado como uma centralidade a ser acentuada e a função habitar é fundamental dentro de todo esse processo.
Euler aponta vários exemplos de ações no sentido da utilização dos espaços urbanos para o comércio informal, tanto no Brasil, como na América do Norte e na Europa. “Alguns funcionam muito bem, outros se configuram como soluções desastrosas”. Bem próximo à Fortaleza, a cidade de Recife fez construir equipamentos urbanos para abrigar o mercado informal. “É muito mais responsável de minha parte indicar caminhos a serem analisados”, argumenta.
O primeiro é o já citado da utilização de edificações de interesse histórico, que ele avalia ser o mais apropriado, depois a da construção de mobiliários urbanos para abrigar esse tipo de atividade informal e por último, é a construção de um novo equipamento urbano para esse fim. É fundamental, em todo esse processo, diz ele, que se analise quem serão os usuários desses espaços edificados para que o Município não esteja estimulando ações ilegais, menciona Euler, como o contrabando ou a pirataria, e nem a que comerciantes venham a colocar tercerizados no papel de vendedores ambulantes.
Disciplinamento
Na avaliação do sociólogo e historiador, Eduardo Lúcio Amaral, é preciso, também, disciplina urbana. É dever do poder público estabelecer regras mínimas para o convívio social. Estas regras, observa, obviamente, não podem incidir somente sobre os ambulantes — mas devem ser impessoais, de maneira que não haja privilégio ou discriminação. “Poucos estão isentos de responsabilidade no processo de degradação do Centro”, assegura.
Para ele, não é somente o ambulante quem produz a poluição visual ou a poluição sonora; não é só o ambulante quem suja a cidade. “É injusto fazer do camelô o bode expiatório de um problema cuja responsabilidade é de todos”, insiste. Entretanto, declara, não é possível isentar o camelô de sua parcela de responsabilidade, principalmente no que diz respeito à obstrução das vias públicas e de sua privatização. O estabelecimento de um “camelódromo” parece ser a solução de curtíssimo prazo. “É preciso também uma fiscalização muito mais rigorosa”.
Lêda Gonçalves
Repórter
Fonte http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=613632
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