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Indústria financeira avança

By 28/02/2011No Comments

DA PRODUÇÃO AO CONSUMO 28/2/2011

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Embora os apelos sejam sedutores, especialistas recomendam planejar e economizar para comprar à vista, pois as taxas de cartões de crédito e cheques especiais são altíssimas GEÓRGIA SANTIAGO

A indústria financeira ganha espaço no País, que aposta no consumo como motor da economia. Os brasileiros têm cada vez mais acesso ao crédito. Até que ponto os financiamentos trazem risco de uma bolha de crédito?

Na contramão da Europa e dos Estados Unidos – que ainda tentam se recuperar da crise financeira iniciada no fim de 2008 -, o Brasil mergulha na indústria do crédito. A palavra financiamento passou a fazer parte do vocabulário e do cotidiano dos brasileiros, em diferentes camadas sociais. Dados mostram que o estoque de crédito do Sistema Financeiro atingiu R$ 1,7 trilhões, em dezembro de 2010, segundo o Banco Central (BC). Deste montante, R$ 558,3 bilhões foram referentes a operações para pessoa física, o equivalente a 32,8% do volume total de crédito contratado no Brasil.

Relativamente recente no País, a concessão de crédito começou a crescer após o controle da inflação – conquista do Plano Real, implantado em 1994 – e a modernização econômica. Culmina, hoje, com o fortalecimento do mercado de consumo. O economista e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Henrique Marinho, relaciona a expansão nos financiamentos como resultado da política econômica adotada no Governo Lula, de inserção de brasileiros no mercado bancário, facilitando aberturas de contas, criando linhas de crédito e, ainda, como resposta ao crescimento da economia e do mercado de trabalho nos últimos anos.

“Em 2002, o crédito bancário representava cerca de 25% do PIB e, em dezembro de 2010, essa parcela alcançou 46,6%”, informa Marinho. A expansão contínua se dá no crédito às empresas – para capital de giro e novos investimentos – e às pessoas físicas, principalmente no financiamento de bens de consumo durável, como automóveis, motos, eletrodomésticos e para material de construção. O crescimento nas operações atingiu 20,5% em dezembro de 2010, sendo que o desempenho do setor privado foi de 22%, dos quais as operações de pessoas físicas cresceram 21,9% e das empresas em 19,3% – cita Marinho.

Mais renda, mais consumo

O “boom” de crédito e consumo que o Brasil experimenta equivale ao que os Estados Unidos viveram no pós-guerra e na década de 1980. “Há uma ligação do consumo ao fator de crescimento econômico do País”, diz o economista Alex Araújo. O aumento da renda da população, na última década, impulsionou o consumo e redefiniu as classes sociais. Entre 2003 e 2008, pelo menos 34 milhões de pessoas ingressaram nas classes A, B e C, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Os brasileiros ainda financiam sonhos básicos: eletrodomésticos, carros e, mais recentemente, imóveis”, explica Araújo. Boa parcela da população que tinha demanda reprimida: queria comprar, mas a renda baixa e a falta de financiamento não permitiam.

Disparidade regional

Araújo faz uma ressalva: o quadro de distribuição das operações de crédito no Brasil mostra discrepâncias regionais. “O volume de financiamentos é maior nas regiões de renda mais elevada”. Segundo o BC, a região Sudeste tem a maior carteira de crédito do País: 56,9% – maior que a soma de todas as demais regiões. O Nordeste fica com apenas 12%.

Na região nordestina, o crédito é direcionado, ainda, ao consumo de bens básicos. Reflexo do nível de renda menor, por conseguinte, do baixo índice de bancarização da população. “Mas a gente começa a perceber, entre a população nordestina, crescimento de demanda por viagens internacionais e outros serviços, que não necessariamente são de luxo, mas que refletem novos padrões de consumo”, pontua Araújo. Apesar da concentração no Sudeste, a demanda por financiamentos vem crescendo no Nordeste. Conforme Henrique Marinho, as operações de crédito no Norte tiveram aumento de 26,1%. E, no Nordeste, de 28,3%. “Desempenhos acima da média nacional, destacando-se as modalidades de crédito consignado de pessoas físicas e de empréstimos de capital de giro para pessoas jurídicas”.

Poupança zero

O país do futuro não tem poupança interna – a poupança representa apenas 17% do PIB nacional, para 25% na China. “Poupar para quê? O importante é consumir”, diz o estudante que acaba de ganhar seu cartão de crédito, mesmo sem emprego ou renda.

“Para as economias se desenvolverem, há necessidade do novos investimentos produtivos e de infraestrutura. E os recursos são provenientes da capacidade de poupança da população”, explica Marinho. Quando o País poupa pouco, os recursos destinados ao investimento consequentemente não crescem.

SAMIRA DE CASTRO
REPÓRTER

Expansão

1,7 Trilhão de reais foi o volume do estoque de crédito no Brasil, em dezembro de 2010. Deste montante, R$ 558,3 bilhões foram referentes a operações de financiamento a pessoas físicas

TAXAS DE JUROS
Sonhos de consumo ainda custam muito caro

“Quer pagar em quantas vezes?” A frase, do anúncio de uma rede de varejo de eletroeletrônicos, resume a facilidade de crédito que seduz o consumidor. O problema é que, no Brasil, os financiamentos ainda embutem altíssimas taxas de juros. O País tem um dos mais elevados “spreads” bancários (diferença entre os juros cobrados pelos bancos nos empréstimos a pessoas físicas e jurídicas e as taxas pagas pelas instituições aos investidores que colocam seu dinheiro em aplicações do banco), tornado o crédito muito caro, sobretudo no cheque especial e cartão de crédito.

As taxas de juros do cheque especial e cartão de crédito atingiram 170,7%, em média, em dezembro de 2010, enquanto a destinada ao crédito pessoal foi de 44,1%, segundo o Banco Central. “São juros imorais”, resume o economista Alex Araújo. “Isso não é taxa, é punição”, completa. Lembra que o consumidor norte-americano toma empréstimo a 3% ao ano. Ele compara com os valores cobrados em outras modalidades: no empréstimo consignado, o juro é de 1,7% a 2% ao mês. No crediário da loja, vai de 2% a 4%, mensalmente.

Araújo explica que o crédito é caro no Brasil porque, para começo, a taxa básica de juros da economia é alta: 11,25% ao mês. Nos Estados Unidos, vai de 0,8% a 1% ao ano. Também há o risco de inadimplência, custos operacionais, impostos e outras obrigações, além do ganho da instituição financeira.

“Custo operacional e risco de inadimplência são utilizados pelos bancos para justificar as altas tarifas cobradas”. Para Araújo, se os bancos informam que emprestar embute altos custos, não deveriam ofertar crédito com promessa de satisfação pessoal. “É destoante o que a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) informa e o que acontece na prática, pois o que se vê é uma oferta ainda maior de crédito em bancos, lojas etc”.

Parte da tecnologia que foi trazida de fora para os bancos usa modelos matemáticos que tentam identificar clientes com perfil de baixo risco. Isso exemplifica, conforme Araújo, o acesso dos estudantes universitários ao cartão de crédito. “Eles representam baixo risco à instituição que empresta, tendo em vista o próprio perfil dos universitários hoje: a maioria de classe média a alta”, completa.

Ante a realidade das taxas extorsivas, é preciso cautela. “Portanto, é necessário que o cidadão tenha muito cuidado em não cair na ilusão do crédito fácil”, aconselha o economista e professor Henrique Marinho. “Sempre, antes de se envolver com operação dessa espécie, é importante uma programação em função do seu orçamento”.

“Na maioria das vezes é melhor se preparar para comprar à vista, juntando o dinheiro antecipadamente, mas, às vezes, as lojas realmente oferecem boas oportunidades”. Nesse caso a pesquisa é o melhor negócio, porque como os juros são livres, eles também fazem parte das chamadas mercadológicas, ou seja, as liquidações podem ser feitas em função dos preços e do prazo do financiamento ou mesmo de juros mais reduzidos e até sem juros. (SC)

Fonte Diário do Nordeste
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=941127

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